Transição Socialista

Por uma CSP-CONLUTAS à altura dos desafios históricos!

14.10.2017

Apesar de todos os elementos importantes que devemos discutir sobre a conjuntura brasileira; apesar da homenagem à Revolução Russa… Há uma tarefa muito mais importante e urgente, à qual a CSP-Conlutas deve se voltar com todas as suas forças e energias desde já: a preparação consciente das condições para realizar a revolução socialista hoje.

1. Os sindicatos na época atual

Em nossa época histórica — época do capitalismo em decadência, em que as forças produtivas pararam de crescer — não há espaço para um sindicalismo neutro ou simplesmente “combativo”. O movimento da classe trabalhadora não pode mais avançar se a vanguarda não tiver a melhor definição de sua estratégia. Portanto, ou os sindicatos agem para fazer a revolução ou se tornam agentes do Estado burguês dentro do movimento da classe trabalhadora. Não há mais meio termo. Isso nos ensinou Leon Trotsky em um de seus últimos textos (“Os sindicatos na época da decadência imperialista”).

O que está em questão nesta plenária da CSP-Conlutas não é apenas a tática mais correta diante do governo Temer, nem fazer homenagem à Revolução Russa (coisas importantes); o que está em questão realmente, e definirá a existência da CSP-Conlutas no futuro, é o programa que ela adotará e levará para as camadas amplas da classe trabalhadora.

Temos de definir se queremos um sindicalismo revolucionário ou se queremos um sindicalismo que se adapta às demais centrais sindicais, vinculadas ao Estado. Queremos que a CSP-Conlutas seja conhecida como o grupo de combate que, pela luta e resistência, realmente prepara as condições para a superação do capitalismo, ou queremos que seja conhecida como o grupo que fala um pouco mais grosso, que consegue alguns reajustes salariais melhores, que fala sobre socialismo, mas, na prática, age com uma lógica similar à das demais centrais sindicais?

A CSP-Conlutas, por ser o que há de mais importante na vanguarda da classe trabalhadora brasileira, não pode ter medo de se isolar. A única condição para resistir no isolamento é ter consciência de seus fins e segurança na sua ação. Às vezes é melhor ficar isolado e ser minoria hoje, para preparar as condições de ser maioria amanhã. Se isolar não significa deixar de fazer frentes, unidades e alianças com outras centrais. Isso está correto. Se isolar significa se diferenciar, assumir outro caminho. A preocupação da CSP-Conlutas não deve ser a de conciliar para ser o guarda-chuva de vários grupos ou lutadores diferentes. A preocupação da CSP-Conlutas deve ser a de definir e determinar seu programa ao máximo possível, para que a vanguarda da classe, organizada sob sua bandeira, conduza o conjunto dos trabalhadores à tomada do poder político.

As necessidades objetivas colocadas para o conjunto da classe trabalhadora — embora ela própria não tenha consciência disso — não são as de conseguir meros reajustes salariais ou meras garantias de emprego. As necessidades objetivas são as de vincular as lutas por salário e emprego necessariamente à luta pela tomada do poder político. Se a CSP-Conlutas não colocar para si própria esse problema, ela não estará à altura das necessidades e desafios colocados no presente. Devemos nos preparar!

2. A forma correta de lutar por empregos e salários

Emprego e salário são as questões centrais da luta da classe trabalhadora em todo o mundo, portanto, nosso sindicalismo revolucionário deve se focar nessas questões (não se deve, é claro, ignorar outras lutas que possam surgir a partir de outras questões, mas deve-se considerar emprego e salário como o principal).

Com a mudança em nossa época histórica, assim como não é mais possível ter neutralidade no meio sindical, não é mais possível ter neutralidade na forma como se luta por emprego e salário. A forma de luta da época histórica anterior, do final do século XIX — luta por aumentos salariais anuais e diminuições fixas da jornada de trabalho —, já não serve mais para a classe trabalhadora e é usada pela burocracia sindical para paralisar o movimento da classe.

Essa forma antiga (que chegou até nós pela Segunda Internacional), é a maneira dos reformistas lutarem por emprego e salário. Ela não aponta para a revolução. As reivindicações se encerram e si mesmas, e, por isso, essa é a forma defendida pela burocracia sindical. Contra isso, devemos estabelecer a forma dos revolucionários lutarem por emprego e salário. É a forma em que a luta parece a mais mínima, justa e necessária para o conjunto dos trabalhadores, mas, ao mesmo tempo, é impossível de se realizar no capitalismo. É a forma em que a classe luta pelo mais básico, mas, ao lutar por aquilo, atinge o socialismo. Não se trata de falar ou doutrinar sobre socialismo, mas de conduzir ao socialismo. Essa forma parte das reivindicações transitórias, as que são mínimas e máximas ao mesmo tempo (permitem transitar do mínimo ao máximo), as que parecem pouco mas já são em si socialistas.

As reivindicações transitórias são a escala móvel de salários e a escala móvel das horas de trabalho. Com a escala móvel de salários, os salários, com um mínimo assegurado, são reajustados todos os meses, de acordo com a inflação dos produtos básicos do trabalhador. Com a escala móvel das horas de trabalho, a jornada de trabalho, com um máximo assegurado, é reajustada todos os meses, de acordo com a necessidade de produção naquela empresa.

Com a escala móvel de salários, os trabalhadores não esperam um ano inteiro para terem seu salário reajustado, mas estabelecem um contrato de trabalho que garante o aumento salarial automático todo mês, de acordo com a inflação básica. Assim não se acumula a perda salarial no ano. Isso é fundamental, pois quando se acumula a perda, o trabalhador nunca consegue repor tudo novamente. Por exemplo, depois de um ano, acumula-se 14% de defasagem. Então, o sindicato faz uma luta, paralisações e greve, e, no final, consegue 10% de aumento. Para o trabalhador, parece melhor do que nada. Só que, ao mesmo tempo, houve uma perda de 4%. Apesar da perda, o sindicato saiu bem na foto — afinal, conseguiu 10% de reajuste —, e a classe trabalhadora acabou aceitando um reajuste que não era o ideal. Essa forma — deixar acumular um ano para depois lutar — é justamente a forma do reformismo, porque o capital sai ganhando (em 4%), a classe trabalhadora perde (4%) e o sindicato parece combativo. Mas, assim, mantém-se a ordem capitalista, e, num longo prazo, após alguns anos, somente se legitima a queda no nível de vida classe trabalhadora. Com isso, também, quebra-se a disposição de luta dos trabalhadores, no mesmo processo em que se mantém a burocracia sindical. A escala móvel de salários luta exatamente contra essa brecha aberta para a capitulação e a conciliação!

Já a escala móvel das horas de trabalho é a melhor maneira de lutar contra as demissões. Sabem os companheiros que nos períodos de crise a produção baixa. Então, a empresa, além de demitir, encontra várias formas de deixar parte dos trabalhadores de molho, na geladeira. Para muitas empresas, isso é melhor do que pagar compensações trabalhistas pela demissão. Vimos isso, por exemplo, com o PPE (Programa de Proteção ao Emprego, da Dilma): os trabalhadores tinham uma jornada muito inferior, mas também recebiam um salário muito inferior. Ora, a escala móvel das horas de trabalho é o reajuste mensal da jornada, de acordo com a necessidade de produção naquela empresa, mas sem qualquer redução salarial. Ou seja: se é preciso diminuir as horas de trabalho, todos continuam trabalhando, mas trabalham menos horas e continuam com o mesmo salário de antes. Reivindicar a redução para uma semana fixa de trabalho (40h ou 36h) não resolve o problema, pelo simples fato de que, em épocas de crise aguda, como a que passamos, as empresas às vezes têm de produzir com uma semana inferior a 36h. Ou seja: fixar a semana de trabalho mantém a brecha para que a empresa justifique sua necessidade de demissão de trabalhadores. O acordo da escala móvel de trabalho é a melhor forma de garantir a não demissão, pois é a garantia da estabilidade de todo trabalhador.

Nada há de mais legítimo e justo para o trabalhador do que a mera estabilidade: apenas manter os atuais empregos e o atual poder de compra. Ninguém está pedindo nada de demais, nem um grande aumento ou uma redução enorme da jornada de trabalho: estamos pedindo apenas estabilidade no salário e no emprego. Que não piore! Só queremos trabalhar em paz e com dignidade. Isso é o mínimo que cada trabalhador quer.

Os revolucionários devem saber partir desse espírito defensivo, o espírito conservador da classe trabalhadora. Os sindicalistas tradicionais, ao tentarem parecer ofensivos — falando de “ganhos reais”, com propostas de grandes porcentagens de aumento salarial e de redução fixa da jornada —, apenas descolam-se do caráter geral defensivo e conservador da classe trabalhadora. Ora, mesmo o mínimo o capitalismo já não pode manter, portanto, a luta por ele, da forma certa, pode conduzir ao socialismo.

Como explicou Trotsky, as escalas móveis parecem pouco, mas só podem se realizar no socialismo porque são o modo como funciona a economia da sociedade socialista, onde não há defasagem entre o que recebem os trabalhadores e o valor geral dos produtos, onde não há desemprego, onde trabalha-se de acordo com a necessidade social de produção para atender às necessidades de todos (veja texto “Sobre o atraso político dos trabalhadores norte-americanos”, de Trotsky).

Além de tudo isso, as escalas móveis podem ser reivindicadas por todas as categorias ao mesmo tempo; podem unificar as campanhas salariais de metalúrgicos, carteiros, professores, etc. numa só reivindicação. É o fim dos índices particulares. Em vez de cada categoria ter o “seu mês” de luta, as escalas móveis, por serem mensais, não dependem de época do ano. Elas unificam a classe como classe. Elas também podem ser exigidas ao mesmo tempo pela classe trabalhadora de países diferentes. Que impacto não teria a classe trabalhadora brasileira e a argentina pararem ao mesmo tempo, com as mesmas reivindicações, contra o peso da crise capitalista em suas vidas? Isso é criar as condições reais para a transição ao socialismo.

Os revolucionários não têm de ficar falando de socialismo para encobrir o fato de que, na prática, usam o programa reformista da burocracia sindical (que não leva ao socialismo). Os revolucionários têm de fazer hoje o socialismo, agir já e conscientemente pelo socialismo. Lutar pelo socialismo coincide com a manutenção das condições de vida atuais da classe trabalhadora.

3. Criar o poder operário

O operariado industrial é a vanguarda objetiva do conjunto da classe trabalhadora, pois só dele se extrai mais-valia (capital, riqueza em sua forma capitalista). Se ele para, o capital não tem alimento, não cresce, e a contradição de nossa sociedade é colocada em alto grau. Isso significa que o operariado está destinado a conduzir o conjunto dos trabalhadores e setores oprimidos na revolução. Ou seja: uma central sindical que queira realmente ser combativa tem de ter um plano de expansão para os principais setores operários do país. Isso não significa, é claro, desprezar os trabalhadores não industriais, nem os funcionários públicos, mas significa usar a estrutura dos sindicatos desses trabalhadores para fazer crescer a influência da central nas categorias operárias industriais fundamentais. Sem isso, não há chance de luta séria.

As escalas móveis, combinadas, justamente por apontarem para além do capitalismo, têm o poder de fazer as formas de luta crescerem, desde a mais mínima, no âmbito do local de trabalho, até a mais ampla, no âmbito nacional e estatal. Mas esse “estatal” não significa o Estado oficial, burguês, e sim a organização política independente, paralela, o poder dos trabalhadores, em âmbito nacional. Trata-se da estratégia de ampliação do poder operário (“dual” ou “paralelo”) — um poder que nasce localizado numa só fábrica, mas amplia-se a outras da mesma categoria, depois a outras da mesma cadeia produtiva, do mesmo truste e, por fim, a toda a economia nacional. Quando o poder da classe trabalhadora ganha escala nacional, ele está pronto para assumir o controle da sociedade, no lugar do poder oficial (Estado burguês). Isso é o que fizeram os bolcheviques em 1917.

Hoje os sindicatos são essas formas amplas que nós conhecemos, que abarcam enormes regiões e até cidades diferentes, mas em sua gênese histórica eram a organização dos trabalhadores em cada fábrica, em cada local de trabalho. Essas formas amplas de hoje fortaleceram-se para facilitar o controle do Estado burguês sobre a classe trabalhadora. A função dos revolucionários é voltar à forma do passado e recriar a representação original e democrática dos trabalhadores em cada fábrica. São os comitês de fábrica. É claro que, num primeiro momento, esses comitês muitas vezes terão de ser clandestinos (do contrário, os operários que se expuserem perderão o emprego). Os lutadores de cada empresa têm de preparar seu comitê clandestino dentro de sua empresa, e esse comitê virá à luz na hora certa, na hora da luta, na hora de arriscar. Será preciso impor, contra a vontade da empresa (e muitas vezes contra a vontade do sindicato), pela luta, o comitê como legítimo representante dos trabalhadores daquela empresa.

O comitê de fábrica deve ser eleito por todos os operários da fábrica, e seus representantes podem ser destituídos a qualquer momento (em qualquer nova assembleia). Não deve haver espaço para burocratas carreiristas. Quando surge, o comitê é o primeiro elemento da dualidade de poder. Isso significa que o poder (controle) sobre a fábrica está dividido: em parte quem manda é a gerência dos patrões, mas em parte é também o comitê, de acordo com a vontade dos operários. Isso não é impossível. Tivemos muitos comitês assim em nossas empresas na década de 1980. A tarefa histórica dos revolucionários é generalizar esses comitês, prepará-los primeiro sigilosamente em cada fábrica, para depois ampliá-los para cadeias produtivas e regiões mais amplas. Assim são criadas as condições do poder operário de amanhã. A tarefa da CSP-Conlutas deve ser a de preparar isso tudo conscientemente, por meio da inserção de sua vanguarda lutadora nas principais industrias capitalistas nacionais.

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Tais as primeiras e mais básicas tarefas: mudar o programa da CSP-Conlutas, adotando o programa dos revolucionários no meio sindical (escalas móveis), e focar no operariado industrial, realizando um trabalho clandestino com vistas a criar os comitês de fábrica (primeira forma do poder operário). Se a a CSP-Conlutas ao menos se propuser a efetivar esses primeiros passos, já abrirá um grande e novo caminho rumo a um sindicalismo realmente combativo no Brasil, que fará época na classe trabalhadora.

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PROPOSTAS PARA ESTE CONGRESSO

Endossamos três propostas de resoluções apresentadas pelo SINTUSP ao 3° Congresso da CSP-Conlutas, aprovadas em assembleia da categoria e resumidas aqui por nós:

1. PROGRAMA DE UNIDADE PELO MÍNIMO:

A CSP-Conlutas deve buscar superar a fragmentação das lutas indicando um programa comum para todos os sindicatos e movimentos sociais, unificando também empregados e desempregados. Precisamos de um programa único de combate ao arrocho salarial, ao desemprego e às demissões, principais males que atingem o proletariado no período de decadência do capitalismo.

Para os empregados, indicamos as reivindicações de repartição das horas de trabalho e reajuste mensal dos salários de acordo com a inflação (escalas móveis de horas de trabalho e de salários). (…) Para os desempregados, que podem ser organizados nos movimentos populares, indicamos a reivindicação por frentes públicas de trabalho. (…)

2. DEMOCRACIA OPERÁRIA E COMITÊS:

Que nas bases da CSP-Conlutas toda luta seja organizada da forma mais democrática possível e envolva o maior número de trabalhadores para além dos dirigentes sindicais e cipeiros. Deve abarcar não só os sindicalizados, mas também os setores mais desorganizados e oprimidos das categorias.

Em períodos de mobilização, as assembleias devem ser frequentes e as demais instâncias ordinárias dos sindicatos devem ser ultrapassadas por organismos superiores e mais amplos, como os comandos de greve, com delegados eleitos nas assembleias de base ou os comitês de fábrica. A depender das condições de repressão nas empresas, os sindicatos devem estimular a criação de comissões clandestinas pelos operários de base. Contra a burocratização e a adaptação, os dirigentes sindicais não devem criar empecilhos à criação de organismos mais democráticos como esses para manter o aparato sob seu controle restrito.

3. INSERÇÃO NAS FÁBRICAS:

A CSP-Conlutas indica aos sindicatos e movimentos filiados que apoiem a organização dos operários das fábricas de sua região. Entendemos que a classe operária industrial é a vanguarda do proletariado e sua organização nos locais de trabalho é fundamental para a construção do poder de todos os explorados e oprimidos. Apenas sob sua direção teremos condições de, no futuro, tomar os principais meios de produção do país e reorganizar a economia, reconstruindo a sociedade de forma socialista.