Transição Socialista

A violência oculta dos gabinetes

“Estamos chocados com a violência dos ataques e, sobretudo, com a morte da menina. Mas agimos com rigor, prendendo os suspeitos em menos de 30 horas”.

Esta foi a declaração da governadora do Maranhão, Roseana Sarney, referindo-se aos incêndios dos ônibus ateados por pessoas supostamente comandadas por presidiários do Complexo de Pedrinhas, causando a morte de uma menina que estava dentro do ônibus e não resistiu aos ferimentos causados pelo fogo.

A revolta dos presos de Pedrinhas não é um fenômeno recente. Ela se estende por vários meses. Em outubro de 2013, Roseana já havia decretado estado de emergência no sistema prisional maranhense, pedindo reforço ao Governo Federal.

O que a governadora não falou em sua declaração à imprensa é que ainda falta prender alguns suspeitos. Antes de esclarecer quem possam ser esses suspeitos, analisemos as condições de vida nos presídios.

Superlotados, pontos de tráfico e consumo de drogas, redutos da prostituição e abusos sexuais, dominados por facções do crime organizado, os presídios são verdadeiros infernos humanos. Em 2013 foram assassinados 56 presos em Pedrinhas, 13 deles decapitados, por não conseguirem atender às ordens das organizações criminosas. Dentre essas ordens estariam o ingresso de chips de celular e de drogas e – pasmem – o direito dos chefes da facção estuprar as esposas dos detentos. A irracionalidade das exigências explica o não cumprimento generalizado. Os presos optaram pela morte a colocarem em risco a integridade física de suas companheiras. A maioria dos mortos havia cometido crimes leves, ou seja, eram os chamados “ladrões de galinha”, não estando vinculados a qualquer organização criminosa.

Isso significa que membros da classe trabalhadora que acabam cometendo pequenos delitos tornam-se vítimas das organizações criminosas no interior das penitenciárias brasileiras. Além de representarem importantes instrumentos de valorização do grande capital – o tráfico de drogas e a indústria de armas estão entre as atividades mais lucrativas no mundo – o crime organizado tem se revelado como um braço armado da burguesia para liquidar a classe trabalhadora. A barbárie existente no interior das penitenciárias serve como um alerta da burguesia aos trabalhadores: “não saia da linha, senão nós te mandaremos pro inferno!”

A tendência é a situação se deteriorar ainda mais no interior das penitenciárias, uma vez que a massa carcerária brasileira tem aumentado vertiginosamente nos últimos 13 anos. De 2000 para cá o número de presos mais do que dobrou, passando de 232 mil para 560 mil, um aumento de 141%. O Brasil possui a quarta maior população carcerária do mundo. Fica atrás apenas para os EUA, Rússia e China.

Diante do exposto aqui, cabe perguntar se haveria alguma solução para o caos nos presídios brasileiros.

Privatização do sistema! Gritam em uníssono os capitalistas e seus representantes. Na verdade, a privatização do sistema prisional brasileiro já está bastante avançada. As empresas privadas dividem com o setor público a prestação de serviços em 22 presídios de 7 estados.

No Maranhão não é diferente. O gasto do governo Roseana Sarney (PMDB) com as duas principais fornecedoras de mão de obra para os presídios no estado chegou a R$ 74 milhões em 2013, um aumento de 136% em relação a 2011. Uma das empresas que mais receberam verba, a Atlântica Segurança Técnica, obteve, em 2013, um repasse de R$ 12,9 milhões do governo maranhense. Seu representante é Luiz Carlos Cantanhede Fernandes, sócio de Jorge Murad em outra empresa, a Pousada dos Lençóis Empreendimentos Turísticos. Murad é marido da governadora.

Há 12 anos, em 2002, a Polícia Federal havia detectado indícios de corrupção nas empresas da família Sarney. Naquela ocasião, a PF apreendeu R$ 1,34 milhão em dinheiro vivo na sede da empresa Lunus, de Murad e Roseana. Na época, em entrevista à revista Veja, Fernandes (o “laranja” dos Sarney) disse que parte desse dinheiro (R$ 650 mil) veio de empréstimo da sua empresa Atlântica.

A governadora anunciou na semana passada que receberá um financiamento do BNDES de R$ 53 milhões para investir nos presídios. Quanto desse montante chegará ao seu destino? Quanto desse recurso público servirá para melhorar as condições de vida dos presidiários?

A corrupção explica, em parte, porque os governos têm gasto mais do dobro com o pagamento das empresas terceirizadas do que gastavam quando administravam sozinhos os presídios. Nos locais em que a gestão é privada, o custo médio de um detento (alimentação, vestuário, higiene, assistência médica e psicológica, segurança interna e assessoria jurídica) alcança R$ 3 mil e é bancado pelos mesmos governos que antes gastavam apenas R$ 1.200/preso. Segundo os órgãos que fiscalizam as condições de vida nos presídios, estas não mostraram qualquer melhora depois do ingresso da iniciativa privada.

Voltando à questão que ficou sem resposta, podemos agora concluir quem seriam os outros suspeitos do crime organizado que ainda não foram presos. Embora ocultos atrás de seus cargos públicos e de seu capital, os principais responsáveis pela violência que matou a menina e mata os presos nas penitenciárias maranhenses é a família Sarney e seus colegas de classe.

Como se vê, a violência e a corrupção são irmãs gêmeas. Elas nasceram com a sociedade de classes e se generalizaram com o capitalismo. Por serem fenômenos originários do capitalismo, estão cunhados como princípios intrínsecos a esse sistema. São indissociáveis dele. Para superá-los é necessário fundar um novo princípio, o princípio baseado na propriedade comum dos meios de produção, o princípio baseado na garantia e na obrigatoriedade de trabalho a todos que estejam aptos a trabalhar.

Somente quando a humanidade for capaz de estabelecer esse novo princípio, somente quando a humanidade alcançar essa nova época histórica não haverá mais crianças mortas incendiadas nos ônibus e trabalhadores decapitados nas prisões. Nesses novos tempos que se anunciam a Sra. Roseana terá razões de sobra para se chocar, não mais com a violência do presente, mas com a violência do passado, a violência que era produzida e reproduzida pela sua própria classe.

FIM À BARBÁRIE CAPITALISTA!